Como o cérebro reage ao estresse gerado pela epidemia da Covid-19?

Sandro Azevedo | 4824 Visualizações | 2020-06-23T22:27:56-03:00
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A pandemia desencadeada pelo novo coronavírus submete a população mundial a um estado de alerta crônico que pode afetar o funcionamento cerebral e o sistema imunológico, segundo a neurocientista francesa Catherine Belzung, professora da universidade de Tours.

Depois quase dois meses de confinamento, a população francesa retoma aos poucos seus hábitos nas ruas, tomando cafés nos bares, passeando nos parques, fazendo compras ou indo ao cabelereiro. Mas a vida de fato voltou ao normal? Não. Foi preciso se acostumar a usar máscara de proteção, manter a distância física e limitar os contatos com pessoas próximas, como familiares, ou não. A epidemia não chegou ao fim e o vírus ainda circula.

É impossível dizer, também, se haverá ou não uma segunda onda epidêmica como a ocorrida entre março e maio, período do confinamento. Essas possibilidades ativam o cérebro de maneira nociva, o deixando constantemente em estado de alerta, lembra Catherine Belzung.

As consequências desse estresse crônico a médio e longo prazo afetam o funcionamento cerebral, explica a cientista francesa. “Quando estamos diante de uma situação perigosa, temos uma série de regiões do cérebro que vão detectar esse perigo", explica. Uma delas é a amígdala, que faz parte do sistema límbico. Ele gerencia, entre outras funções, nossas emoções e comportamento social.

O cérebro é ativado em permanência para sinalizar que existe um risco iminente. Há regiões, como o hipocampo, que atuam na memorização dessa situação de perigo e de sua contextualização, e outras, como a pré-frontal, que vão regular a resposta cerebral gerada pela amígdala e o hipocampo. Esse circuito de três regiões, diz a pesquisadora francesa, são essenciais para o equilíbrio cerebral. “Quando a situação se torna crônica e se repete, começamos a observar mudanças no cérebro. As regiões pré-frontais serão menos eficazes e também há uma diminuição do volume”, detalha.

Em contrapartida, a atividade da amígdala aumenta, ressalta a especialista francesa. Os neurônios da região se desenvolvem ao mesmo tempo que suas conexões. Se a situação de alerta se repete, como no caso da epidemia do coronavírus, e se torna crônica, as áreas do cérebro que regulam as emoções serão menos eficazes.

O estresse permanente também desencadeia a produção de alguns tipos de hormônios, como o cortisol. “Quando o stress é crônico, o nível de cortisol não pode voltar ao estado inicial e continua elevado de forma permanente, porque não tem tempo de descer entre duas situações estressantes. Em um nível elevado de forma constante, ele é extremamente perigoso para o cérebro”, lembra a pesquisadora francesa.

Essa secreção excessiva a longo prazo gera a destruição dos neurônios do hipocampo, das conexões neuronais do córtex pré-frontal e ativa a amígdala. Outra consequência desse estresse crônico, paradoxalmente, é que ele enfraquece o sistema imunológico, o que predispõe os indivíduos a infecções e, portanto, ao coronavírus.

Novo estudo

A neurocientista francesa, especialista na biologia das emoções, contou em entrevista que solicitou um financiamento para um estudo sobre a atitude das pessoas durante o confinamento. “Uma coisa que podemos observar, que é muito clara, é que as reações das pessoas, diante da situação é muito variável. ”

Ela cita como exemplo o fim do confinamento. “Tem pessoas que entram em pânico, se sentem bloqueadas, que não saem de casa. Nelas, o efeito do estresse é menos marcante. Minha hipótese é que quem é mais proativo está mais protegido do stress”. Ela cita como exemplo pessoas que se engajaram em programas sociais, distribuindo comida para os sem-teto, por exemplo.

O pós-confinamento também é uma fonte de estresse, afirma, talvez até mais do que no período do confinamento, quando as famílias criaram uma espécie de “ninho” em casa. “Não voltamos à situação de antes. O mundo que conhecemos depois do confinamento não é o mesmo mundo de antes do confinamento. Andamos de máscara e respeitamos a distância física, além do risco que as pessoas têm de perder o emprego. Essa situação de fim de confinamento também é muito estressante”.

Risco de segunda onda

A pesquisadora também lembra que o retorno da epidemia na China jogou uma ducha de água fria nas pessoas que pensavam que a vida estava voltando ao normal. Segundo ela, a situação na China é preocupante, o que mais uma vez aumenta a carga de estresse. “As pessoas começam a imaginar que a crise, na verdade, não chegou ao fim”.

Fonte: G1

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